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terça-feira, 24 de maio de 2016

O que significa o princípio da inimputabilidade da rede?



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A inimputabilidade da rede é um dos dez princípios para governança e uso da internet elaborados pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI. Br)1, e implica na responsabilização dos autores de ilícitos cometidos na rede, e não dos meios de acesso e transporte, tais como os provedores de conexão ou de aplicação.
A responsabilidade civil, conforme dispõe o artigo 927, doCódigo Civil Brasileiro2, traduz-se na exigência de reparação de um dano causado por um ato ilícito. A responsabilidade civil exige, em regra, que a conduta causadora do dano tenha sido praticada com dolo ou culpa, salvo nas hipóteses de responsabilidade objetiva (por exemplo, em caso de danos ao meio ambiente).
Na seara do Direito consumerista, haverá responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços ou produtos por vício do serviço ou produto, conforme dispõe o art. 7º, parágrafo único combinado com o art. 18, do Código de Defesa do Consumidor3.
Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/20144), em seu artigo 18, traz a regra da inimputabilidade da rede, in verbis:“O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros”.
Para haver a responsabilização civil dos provedores por danos causados na rede, é necessária a existência de ordem judicial exigindo a retirada do conteúdo e a inércia do provedor em cumprir a ordem judicial.
A exceção a esse sistema de responsabilização ocorre em casos de dano à intimidade por divulgação não autorizada de cenas de nudez ou de sexo (art. 21, do Marco Civil da Internet), nos quais os provedores serão responsabilizados mediante a negativa da retirada após a simples notificação pelo interessado, sistema conhecido como “notice and take-down”(notificação e retirada, em tradução livre).
Não há que se falar em responsabilidade pelo risco da atividade (art. 927parágrafo único, do Código Civil), pois, conforme aduz a Ministra Nancy Andrighi (2012)5, não é inerente à atividade dos provedores de Internet a exposição a risco por dano moral. Os riscos existentes são aqueles comuns a qualquer atividade comercial.
Nesse mesmo norte, advoga Marcel Leonardi (2010), ao afirmar que “as atividades dos provedores de serviços da Internet não podem ser consideradas atividades de risco, nem atividades econômicas perigosas”6. Portanto, fica afastada a teoria do risco criado para o caso em comento.
O autor, entretanto, esclarece que a ausência de responsabilidade objetiva por atos de terceiros não significa irresponsabilidade absoluta dos provedores de Internet. Destarte, Leonardi (2010) afirma que os provedores poderão ser responsabilizados sempre que deixarem de cumprir seus deveres, dentre os quais se destacam aqueles constantes nos termos de prestação de serviços, a abstenção de censura dos conteúdos, a preservação dos dados técnicos de conexão ou de acesso e o sigilo dos dados. A responsabilidade por esses atos depende do tipo de provedor – de backbone, de acesso, de correio eletrônico, de hospedagem, de conteúdo ou de informação.
Em voto recente acerca do tema, o Ministro Luis Felipe Salomão7 trouxe à tona as teorias da responsabilidade vicária e contributiva para justificar a irresponsabilidade do recorrente por lesão a direitos autorais realizada pelo Orkut, pois, no caso em análise, não teria havido “lucratividade com ilícitos praticados por usuários em razão da negativa de o provedor exercer o poder de controle ou de limitação dos danos, quando poderia fazê-lo”, nem “intencional induzimento ou encorajamento para que terceiros cometam diretamente ato ilícito”.
Em artigo sobre o tema, Nelson Rosenvald (2015)8 esclarece que a responsabilidade vicária, típica dos sistemas jurídicos da common law, originou-se da responsabilização do empregador pelos atos do empregado, sendo aplicada de forma extensiva pelo STJ, que se utilizou, na verdade, da tese da responsabilidade subsidiária, ou seja, por deterem as empresas aptidão para evitar o ilícito, mesmo não sendo empregadoras nem lucrando com a conduta danosa. Já a responsabilidade contributiva ocorre quando a empresa contribui materialmente para o ilícito alheio, facilitando ou incentivando a sua prática.
A utilização das teorias citadas supra demonstra uma provável modificação da jurisprudência do STJ, que até então vinha decidindo com fundamento na responsabilização subjetiva do Código Civil. Essa nova orientação, antevista no voto do relator, revela um esforço de adequação jurisprudencial ao Marco Civil da Internet, e um respeito ao princípio da inimputabilidade da rede como essencial à garantia dos direitos à informação, à liberdade de expressão e à atividade econômica.
A inimputabilidade dos provedores de Internet como regra noMarco Civil da Internet se justifica pela necessidade de melhor equacionar os direitos envolvidos, como aduz Andrighi (2012), de modo a buscar-se a proteção dos direitos fundamentais como um todo, de forma harmônica, sem que se aniquile a liberdade de expressão essencial para a existência de regimes democráticos.
1O CGI. Br foi criado em 1995, por meio da portaria interministerial nº 147, e é composto por representantes do setor governamental, do meio empresarial, do terceiro setor, da comunidade científica e tecnológica e de um representante de notório saber em assunto da Internet. Dentre suas atribuições está “o estabelecimento de diretrizes estratégicas relacionadas ao uso e desenvolvimento da Internet no Brasil” (CGI. Br.Atribuições. Disponível em:<http://www.cgi.br/página/veja-as-atribuicoes-do-cgi-br/109>. Acesso em 23 de maio de 2016).
2BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406. Htm>. Acesso em 23 de maio de 2016.
3BRASIL. Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. Disponível em:www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acesso em 23 de maio de 2016.
4BRASIL. Marco Civil da Internet, Lei 12.965, de 23 de abril de 2014. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965. Htm>. Acesso em 23 de maio de 2016.
5ANDRIGHI, Fátima Nanci. A responsabilidade civil dos provedores de pesquisa via internet. In: Revista do TST. Brasília, vol. 78, nº 3, jul./set. 2012.
6LEONARDI, Marcel. Responsabilidade civil dos provedores de serviços da Internet. In: Jus Navigandi,2010. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/17128/responsabilidade-civil-dos-provedores-de-servicos-de-internet>. Acesso em 23 de maio de 2016.
7Até o presente momento, houve apenas o voto do relator, não havendo acórdão. O referido voto pode ser encontrado em: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 1.512.647-MG. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=45693836#_registro=201301628832&data=20150805&tipo=91&formato=PDF>. Acesso em 23 de maio de 2016.
8ROSENVALD, Nelson. Responsabilidade vicária e responsabilidade contributiva, 2015. Disponível em: <http://www.nelsonrosenvald.info/#!Responsabilidade-vic%C3%A1riaeresponsabilidade-contributiva/c21xn/566719a60cf256f068ff348a>. Acesso em 23 de maio de 2016.

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