Acorda, Policial e Bombeiro Militar!


O verdadeiro desafio não é inserir uma idéia nova na mente militar, mas sim expelir a idéia antiga" (Lidell Hart)
Um verdadeiro amigo desabafa-se livremente, aconselha com justiça, ajuda prontamente, aventura-se com ousadia, aceita tudo com paciência, defende com coragem e continua amigo para sempre. William Penn.

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Como acabar com a corrupção


O Brasil parece afundar nesse atoleiro, mas, acredite, é possível sair da lama. Medidas importantes podem ajudar a colocar o país na estrada da lisura política

POR Redação Super
Reportagem André Santoro
1. Moral da história
Há 3 tipos de corrupção: a institucional (cujo remédio você vai ver nestas páginas), a cultural (tratada com políticas de educação) e a moral. Contra esta, não há solução. Se você não vê problema em pequenos gestos ilícitos, como molhara mão de um guarda, não é o Estado que vai convencê-lo do contrário.
2. Comitê de recepção
2 “deuses” comandam o mundo da corrupção. A burocracia (dificulta o acesso aos serviços públicos e abre brechas para os “jeitinhos”) e a impunidade (os corruptos raramente são punidos – o que gera mais corrupção).
3. Preparando o terreno
Exatamente porque há um fator moral – e portanto pessoal – que possibilita a corrupção, é impossível extingui-la da política. Mas dá para diminuir o problema. 3 fatores formam a base de sustentação de uma política honesta: educação (leva tempo, mas garante resultados duradouros), participação popular e Estado atuante.
4. Água suja
A corrupção começa antes de o candidato se eleger. Campanhas realizadas com dinheiro sonegado – o tal caixa 2 – alimentam a sujeira. O candidato recebe uma grana preta de um empresário e, depois de eleito, paga em favores. É o famoso rabo preso.
5. Vazamento
Várias medidas podem inibir o uso de caixa 2. Limitar os gastos dos candidatos e usar financiamento público de campanhas, por exemplo. O problema é que elas não resolvem o problema: o dinheiro sujo sempre encontra um jeito de aparecer.
6. Incentivo extra
Incentivo a doações legais podem ser a solução. O governo poderia oferecer benefícios fiscais aos doadores ou dar uma porcentagem extra de dinheiro público aos candidatos que conseguem doações legais.
7. Justiça única
No Brasil, crimes eleitorais são julgados por tribunais especiais (que julgam apenas questões eleitorais). A distinção leva à corrupção. Como resolver? Usar o Código Penal para todos – candidatos ou não.
8. Escapando da Justiça
Políticos corruptos têm seus nomes encaminhados à Justiça Eleitoral. Em tese, seriam inelegíveis a partir desse momento. Mas os recursos conseguem arrastar o processo por vários anos. Quando são condenados, já passaram por vários mandatos e enriqueceram com nosso dinheiro.
9. Infidelidade partidária
As eleições para o Legislativo são proporcionais (o número de cadeiras que um partido ocupa depende do número total de votos na sigla). No Brasil, o cálculo usa o método D`Hondt, que privilegia o número absoluto de votos que a legenda recebeu e incentiva que candidatos nanicos se filiem a legendas maiores só para pegar carona. O resultado é um Congresso com representantes sem comprometimento com as propostas políticas dos partidos, levando ao troca-troca sem fim de siglas.
10. Equação mais justa
O método usado na Noruega (chamado de Sainte-Langue) considera também o númerode votos individuais dos políticos. Assim, dificulta a eleição de candidatos com votações pouco expressivas.
11. Cadeia neles
Funcionários públicos pegos com a boca na botija – ou, para usar uma metáfora mais atual, com dinheiro na cueca – são investigados como qualquer outro cidadão, o que significa processos lentos e puniçõesque nunca chegam. Umadas soluções seria instituir o rito sumário (quediminui a possibilidade de recursos) para processos de desvio de dinheiro público.
12. Toma lá, dá cá
O poder público é obrigado a abrir licitações para compra de materiais e contratação de serviços. O problema é que elas se tornaram foco de corrupção: empresários são favorecidos nos processos de licitação, em troca de propina. O resultado é o superfaturamento: nós acabamos pagando muito por produtos ou serviços que custam bem menos.
13. Todos na rede
Quando a sociedade toda pode acompanhar as compras do poder público, o risco de fraude é menor. Um jeito de garantir essa transparência é instituir licitações eletrônicas, em que qualquer empresa pode concorrer via internet . Tudo às claras.
14. A justiça tarda...
... e falha. Político preso é artigo raríssimo no Brasil. A imunidade parlamentar e as diversas possibilidades de recursos permitem que mesmo os corruptos escapem das punições.
15. A regra é clara
A lei brasileira já é impecável no quese refere às CPIs. A Constituição diz que o Congresso pode instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito desde que um terço dos parlamentares assine o requerimento.
16. CPIzza
Os regimentos internos da Câmara e do Senado determinam que todos os partidos – inclusive os da base de apoio do governo – indiquem integrantes para a CPI. Os governistas muitas vezes atrasam as indicações, de propósito. Ou seja, a CPI, que deve ser um instrumento da minoria, acaba dependente da vontade da situação. Além disso, acordos internos costumam sepultar as investigações.
17. Pressão popular
Mesmo com todas as entrelinhas das normas internas do Legislativo, a CPI costuma sair diante da pressão da sociedade. A mídia tem função decisiva nesse processo.
18. Quem manda?
O Ministério Público investiga suspeitas de corrupção política. Quando termina um inquérito, submete suas conclusões à Polícia Federal e às polícias estaduais para que os culpados sejam presos. Mas quem manda nas polícias são o presidente (no caso da PF) e os governadores (nos estados).
19. Troca de chefia
Para evitar que as polícias descumpram as decisões do Ministério Público, a solução é radical: transferir o comando delas para o MP, invertendo a ordem das hierarquias.
20. Lama neles
Hoje, estima-se que a corrupção custe cerca de 72 bilhões de reais ao Brasil. É mais do que gastamos com educação e quase o mesmo montante destinado à área da saúde.
21. Um país melhor
Lisura política é sinônimo de desenvolvimento social. A redução de 10% no nível de corrupção poderia aumentar em 50% a renda per capita do brasileiro, num período de 25 anos.
Fontes: Bruno Speck, cientista político da Unicamp; Claudio Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Internacional; Jens Andvig, economista do Instituto Norueguês para Assuntos Internacionais; Johann Lambsdorff, economista da Universidade de Oassau (Alemanha); Sérgio Abranches, cientista político e professor visitante da UFRJ

Hermenêutica e positivismo contra o estado de exceção interpretativo

SENSO INCOMUM

Caricatura Lenio Luiz Streck (nova) [Spacca]
Ainda o julgamento do STF
A semana passada foi intensa. O Supremo Tribunal Federal proferiu duas decisões que impactam a cidadania. Uma que flexibiliza fortemente o sigilo bancário, que pode ser quebrado pelo fisco e a outra que diz respeito à flexibilização da presunção da inocência. Escrevi sobre isso (ler aqui). Alertei para o fato de que devemos levar o texto constitucional a sério. Textos são importantes. Não há norma sem texto. O texto não contém a norma. Mas a norma atribuída não pode ser qualquer uma. Mostrei, inclusive, a partir das seis hipóteses pelas quais o Judiciário pode deixar de aplicar a lei, presentes em minha (tentativa de fazer uma) teoria da decisão, que um juiz só pode deixar de aplicar uma lei se esta for declarada formalmente inconstitucional. Pois no HC da semana passada, ocorreu o inverso: o artigo 283, que trata claramente da presunção da inocência, sequer foi tocado. Logo, a decisão fere a jurisdição constitucional.

A decisão do STF provocou uma enxurrada de textos. Há textos oportunistas, textos repetitivos e outros muito sérios. De minha parte, sou otimista. Creio que o constrangimento epistemológico que está sendo feito em relação à decisão fará, em breve, com que o STF revise a sua posição.
Já do lado dos que se colocam a favor da decisão, o que mais me chamou a atenção foi o de Vladimir Passos de Freitas, que, para afastar os argumentos contrários à decisão, disse, de forma peremptória, que “A Justiça não é lugar para discussão de teses jurídicas, mas sim para promover a pacificação social. Correta, pois, a decisão do STF, pois restaurou o equilíbrio entre o direito à liberdade e a eficiência” (ler aqui). Fiquei pensando no que disse o simpático e ilustre colunista. Se a justiça não deve discutir teses jurídicas, para que ela serve? Em outra coluna, voltarei a esse assunto.
Um juiz federal comparou a decisão do STF com um jogo de futebol de 180 minutos (ler aqui). Por que ninguém pensou nisso antes? Vejam o que ele sentenciou: “Como nas fases eliminatórias são dois jogos, a decisão do STF garantiu a presunção de inocência na  primeira e segunda instância. Lá é encerrado o jogo de futebol. Quando o jogo vai para os pênaltis a regra é outra. Ninguém fala em pênaltis quando da expressão ‘jogo de 180 minutos’. A presunção de inocência acaba no segundo jogo”. Bingo. Como diria Fiori Giuglioti: Crepúsculo de jogo. Fecham-se as cortinas e termina o espetáculo. Derrota da presunção da inocência nos pênaltis!
Há também quem sustente a necessidade de fazer a ponderação entre a liberdade individual e o interesse público (sic). Mas, permito-me não falar em ponderação, essa katchanga real pós-moderna (ler aqui) com a qual posso encerrar o jogo e apitar pênalti na hora em que quero.
Para não esquecer, há quem defenda a decisão do STF dizendo que se tratou de mutação constitucional. A estes, sugiro a leitura de um texto escrito em 2007, por Martonio Barreto Lima, Marcelo Cattoni e por mim, em que criticamos duramente a tentativa de mutação constitucional na Recl 4.335. Duvido que alguém ainda fale em mutação depois de ler esse texto (ler aqui).
A importância da lei, do texto, enfim da legalidade constitucional
Fazendo um rescaldo, vou repetir o que venho dizendo. No Estado Democrático de Direito, precisamos levar o texto “em sério”. Já apontando a todo momento as práticas ativistas e decisionistas, clamava pela “legalidade constitucional”. Dizia eu: "Quando uso a expressão legalidade constitucional, com base em Elias Díaz, refiro-me ao fato de que saltamos de um legalismo rasteiro, que reduzia o elemento central do direito ora a um conceito estrito de lei (como no caso dos códigos oitocentistas, base para o positivismo primitivo), ora a um conceito abstrato-universalizante de norma, para uma concepção da legalidade que só se constitui sob o manto da constitucionalidade. Afinal, não seríamos capazes, nesta quadra da história, de admitir uma legalidade inconstitucional. Seria um contrassenso afirmar uma legalidade que não manifestasse a consagração de uma constitucionalidade — e pela efetividade das decisões judiciais sob o marco de uma legitimidade democrática”.

Sendo mais claro e citando um petardo de Díaz: “Parece-me desde logo muito importante essa zona de convergência formada pelo poder constituinte, a Constituição e os grandes pactos políticos e sociais; se depois disso, se depois sobretudo da Constituição, as concretas decisões legais majoritárias vão contra ela (contra essa legitimidade e essa justiça), sensivelmente tais decisões ficam anuladas ao se provar sua inconstitucionalidade pelo Tribunal competente. E conclui Díaz: “Essas maiorias concretas, portanto — mesmo que ‘enlouqueçam’ — coisa que os contumazes antidemocratas alegam sempre e incansavelmente — não poderão fazer nada, por vias legais e democráticas contra a Constituição”.[1] Um bingo a mais para Diaz!
A violação dos pressupostos do processo e da jurisdição constitucional
Vou tentar explicar. O STF não levou em conta nem a história institucional, nem a teoria processual. Nunca, para a teoria do processo ou mesmo para a história institucional, trânsito em julgado significará o mesmo que condenação em segundo grau. Isso porque condenação em segundo grau, sem trânsito em julgado, nunca será decisão definitiva.

Todavia, no tema em questão, essa exigência de diferenciação com base em argumento histórico e na lição da teoria processual — e a lição é de Marcelo Cattoni — traz consigo uma questão de princípio que dá o seu verdadeiro sentido normativo: a presunção de inocência prevalece até o trânsito em julgado de sentença condenatória; ou seja, para a Constituição a presunção de inocência prevalece até decisão judicial definitiva ou condenação judicial definitiva. O que, do ponto de vista do devido processo legal, significa que o ônus da prova é de quem acusa, não de quem se defende.
Entretanto, o STF desconsiderou o argumento histórico e a lição doutrinária que exigem não confundir decisão definitiva com condenação em segundo grau. E, para isso, desconsiderou, justamente, o sentido normativo da garantia da presunção de inocência.
Com base no argumento utilitarista do combate à impunidade, reside a pretensiosa justificativa do STF para desconsiderar a história e a doutrina que ensinam que nem toda decisão de segundo grau, por ser em segundo grau, seja definitiva. Não há ponderação alguma a fazer. O ponto fulcral é: a presunção de inocência é, antes de qualquer coisa, uma garantia processual; é uma questão de processo; é uma regra da argumentação processual. Significa, como diz Cattoni em brilhante palestra na Unisinos, que quem tem o ônus da prova é quem acusa e não quem se defende. Isso é a base do sistema acusatório ou, se preferimos, do processo penal dos Estados Democráticos de Direito. Por isso, quando o ministro Barroso afirma que a condenação em segundo grau inverte o ônus da prova, ele não apenas relativiza a presunção de inocência, mas acaba com ela. E arrisca destruir com isso o sistema acusatório típico do Estado Democrático de Direito.
O combate ao inimigo comum ou aunque mayorias «enloquezcan»
Nesta altura, depois de tantos anos combatendo o ativismo (e seus derivativos), [2] em face da dramaticidade da situação das práticas decisionistas, talvez tenha chegado a hora de buscar alianças estratégicas com os positivistas exclusivos. Isso pode parecer estranho vindo de mim, mas é o contexto que vai ajudar a explicar essa minha denúncia. Convenhamos: estamos esticando a corda no limite do limite. Aliás, poderia citar aqui um conjunto de decisões de tribunais que ultrapassam os limites semânticos (para dizer o mínimo, sem precisar explicar o que entendo por esses limites). Por que é tão difícil cumprir a Constituição naquilo que são os mínimos limites interpretativos (por exemplo, o que é presunção da inocência)? É difícil entender que o Código Civil não pode ser substituído por princípios construídos à revelia de qualquer fonte social confiável (vejam minha concessão teórica neste ponto)?

Portanto, em face desse estado d’arte dramático — por exemplo, os requisitos para a decretação de prisões já de há muito estão sendo ignorados (e esses limites constam na lei) — talvez tenhamos que fazer uma aliança estratégica entre a hermenêutica (na forma antirrelativista que venho propondo, em que se deve decidir por princípio e não por politica, moral, etc.) e alguns pressupostos do positivismo exclusivo, mormente na versão de Raz e Shapiro, defendido no Brasil por autores como Bruno Torrano [3] e André Coelho [4], que consideram que o positivismo é uma análise viável — quem sabe ainda a melhor — da e para a teoria do direito. Discordâncias à parte e examinando a decisão do STF, reconheço que o positivismo exclusivo pode contribuir sobremodo para uma crítica eficaz à essa decisão e ao ativismo que se espalha cada dia mais no país. Isto porque o Direito Penal e Processo Penal são questões de legalidade formal e material e não é o positivismo ou a hermenêutica que vão fazer que isso seja melhor ou pior. Isso tem a ver, sim, com o fato de que a jurisdição só pode ampliar e não restringir direitos. De novo: eis a legalidade indispensável, aunque mayorias «enloquezcan», como diz Diaz. Dizendo de outro modo: face a uma epidemia epistêmica que coloca em risco o direito, lutemos juntos.
Sempre levando em conta o contexto — e isso não quer dizer que cada uma das posturas abra mão de premissas e conceitos —, admito que Raz tem teses que podem servir para melhorar a prática judicial (claro que há outras teses que podem ser úteis, como, por exemplo, as teorias discursivas e a teoria dos jogos de Alexandre Morais da Rosa; mas aqui falo de uma inserção mais radical contra esse EEI - Estado de Exceção Interpretativo, esseinterpretative black holl que que tomou conta do direito brasileiro). Deve haver possibilidades de determinações objetivas no direito. Falei disso na coluna passada, ao fazer críticas a teoria dos jogos no processo, de Alexandre Morais da Rosa (ler aqui). Parece-me que o conceito de preempção de Raz pode contribuir na discussão sobre a presunção da inocência. Razões pessoais, políticas, argumentos de segurança pública, etc.,não podem valer mais do que a Constituição, para ficar no ponto contextualizado. Eis o ponto em comum para meu “plano salvacionista”.[5]
Portanto, em face de um inimigo comum, estendo a mão. [6] Se muitas coisas já vão mal no país, não podemos deixar que argumentos de política, pessoais (moral individual) e utilitaristas — e tenho escrito sobre isso à saciedade — venham a colocar em risco aquilo que de mais precioso construímos: a Constituição de 1988 e seu catálogo de direito e garantias fundamentais.Salvemos e preservemos o direito! E não repitamos erros do passado, quando a doutrina aplaudiu decisões “criativas” porque eram “do bem”. Quando se admite violar a Constituição para cima, já quebramos a cláusula que impede que a Constituição seja violada para “baixo”. De novo: pau que bate em Chico...
Post scriptum: Curiosidade — o pau que bate na "lava jato" bate no japonês?
Não. Não bate. O japonês da federal (JdF) é a prova viva de que o sistema é seletivo. O problema é a lei e a CF ou a sua aplicação? Claro que é a sua aplicação. Bom, no caso JdF, este se beneficiou de tudo aquilo que a justiça federal, hoje, critica e nega para os demais (ler aqui). A justiça federal e o MPF dizem que meras irregularidades (sic) não anulam provas. Pois o JdF se beneficiou da anulação de PAD por “mera irregularidade” (sic). Se não fossem os 12 anos de atraso nesse processo, JdF não teria se beneficiado de prescrição de parte da pena. E como seu recurso está no STJ, poderia estar cumprindo pena... justamente em face da nova posição do STF. Bingo. Em vez disso, desfila todo pimpão liderando os atos de aprisionamento, virando até ídolo. Pobre país em que pau que bate em alguns, não bate em outros. A propósito, Elio Gaspari lembra de uma questão bizarra. É que “a defesa de Ishii [é o nome do JdF] diz que, entre as provas apresentadas contra ele, há transcrições adulteradas de telefonemas interceptados (alô, alô, "lava jato")” (ler aqui) Binguíssimo!


1 DÍAZ, Elias. Socialismo democrático: instituciones políticas y movimientos sociales. Revista de Estudios Políticos (Nueva Epoca), n. 62, out-nov, 1988. p. 50-51.
2 Aqui me refiro aos meus textos e livros, assim como os de meus ex-alunos, alunos e parceiros – todos brilhantes - como Rafael Tomaz de Oliveira -Decisão Judicial e o Conceito de Princípio; Francisco Borges Motta - Levando o Direito a Sério: uma crítica hermenêutica ao protagonismo judicial; Clarissa Tassinari - Jurisdição e ativismo judicial: limites da atuação do Judiciário; Mauricio Ramirez - Crítica à aplicação de precedentes judiciais no Direito Brasileiro. Porto. Alegre: Livraria do Advogado, 2010; Danilo Pereira Lima – Constituição e Poder, todos da Editora Livraria do Advogado; Dierle Nunes - Processo Jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas processuais (Juruá Editora); Alexandre Bahia - Recursos extraordinários no STF e STJ (Juruá Editora; Marcelo Cattoni - Devido Processo Legislativo: Uma justificação democrática do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis e do processo legislativo. (Editora Fórum); Georges Abboud – Discricionariedade Administratriva e Judicial (RT) e tantos outros que aqui não há espaço para referir. Que se sintam citados.
3 Embora Torrano seja um crítico ferrenho de algumas posições minhas, penso que temos um inimigo comum. Por todos, veja-se a interessante crítica ao decisionismo no artigo intitulado Supremo Tribunal Federal não pode ter papel iluminista no Estado; também O direito não é o que você pensa ser justo; e Regra de reconhecimento como contenção ao ativismo judicial
4 Também crítico da hermenêutica, André Luiz de Souza Coelho é um teórico versado na explicitação do que seja o positivismo exclusivo. Dele, sugiro: Raz: Direito, autoridade e positivismo exclusivo, 20 nov 2012. Também importante ler: Raz: razões de primeira, de segunda ordem e autoridade; ainda: "Legality", de Scott J. Shapiro: Uma Introdução".
5 Há um texto muito interessante de Wil Waluchow, Constitutional Rights and the Possibility of Detached Constructive Interpretation, em que ele tenta aproximar Raz e Dworkin para dissolver o conflito entre jurisdição constitucional e democracia (ler aqui). Nessa linha de ligação ou pontos comuns entre Dworkin e Raz, Torrano admite que talvez o maior problema esteja no fato de Raz não estabelecer um modus interpretativo tão claro e convincente como Dworkin fez no Império do Direito, e muitas vezes fica restrito a coisas que acha ser meras “descrições”, quando na verdade há um potencial “normativo” muito forte.
6 De minha parte, como é sabido, minhas diferenças teóricas em relação aos diversos positivismos são de cunho paradigmático-filosófico. Na especificidade, em relação ao positivismo exclusivo o problema reside no seu objetivismo. Mas são questões que não interessam, aqui, neste momento. Quem quer ler mais sobre o positivismo exclusivo, sugiro os textos de Thomas Bustamante - A breve história do positivismo descritivo: o que resta do positivismo jurídico depois de H. L. A. Hart? Novos Estudos Jurídicos (Online), v. 20, p. 307-327, 2015 e deste com Igor Eneiquez - Direito, Estado e Autoridade em Kelsen, Schmitt e Raz. Revista Direito e Práxis, v. 6, p. 81-110, 2015.
 é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.

Revista Consultor Jurídico

CNJ ratifica decisão, e advogados podem ler memoriais em sustentação oral

LIBERDADE DE ATUAÇÃO



O Conselho Nacional de Justiça ratificou de forma unânime decisão do conselheiro Fabiano Silveira que proíbe o Poder Judiciário de impedir advogados de lerem memoriais durante sustentações orais. Silveira adotou esse entendimento ao analisar regra interna do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul que tratava do assunto.
O artigo 378 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul delimita: “Na sustentação oral é permitida a consulta a notas e apontamentos, vedada a leitura de memoriais”. Ao conceder a liminar, o conselheiro do CNJ classificou o dispositivo de “ingerência injustificável na autonomia profissional do advogado” e questionou o fato de a regra excluir o Ministério Público.
À ConJur o autor da ação no CNJ, advogado José Trad, destacou queinterrupções como a sofrida por ele, apesar de exceções no cotidiano das cortes, podem interferir diretamente na decisão do juiz. "Essa quebra de raciocínio prejudica o advogado”, afirmou.
Discussão ampla
O tema tratado pelo CNJ já havia sido discutido anteriormente pelo Superior Tribunal de Justiça. Em dezembro de 2015, ao levar a proposta que proíbe a leitura de memoriais durante sustentações orais na corte, o presidente do STJ, ministro Francisco Falcão, votou favoravelmente.

À época, Falcão chegou a afirmar que advogado que não consegue decorar uma sustentação oral não merece advogar no STJ. Já o ministro Humberto Martins abriu divergência, argumentando que a proibição limitaria indevidamente a atuação do advogado. E foi justamente essa cisão que impediu a aprovação da proposta — por falta de quórum mínimo para aprovação (22 votos), acabou rejeitada. 

Revista Consultor Jurídico

Pode o juiz condenar ante o pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público?

Contrapõem-se os argumentos de ordem processual que impediriam uma possível condenação penal do réu mesmo frente a um pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público.
Trata o art. 385 do Código de Processo Penal da possibilidade do Juiz, mesmo frente a pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público, condenar o réu. Embora, atualmente, pareça óbvia tal prerrogativa, ainda se ouve uma ou outra voz discordante, no sentido que, frente ao requerimento de absolvição formulado pela acusação oficial, estaria o juiz obrigado a acolher o pedido e, por conseqüência, absolver o réu.
Um dos argumentos favoráveis à tese é no sentido de que a Constituição de 1988 adotou, de forma clara, o sistema acusatório, prevendo a nítida separação entre órgão acusador e órgão julgador. No dizer de Américo Bedê Freire Júnior, “deve-se ir além. Mais do que simplesmente a separação entre acusação e julgamento há, para efetivação do jus puniendi, a necessidade de que a acusação e o julgador se entendam quanto à existência de crime. Na verdade há uma relação de prejudicialidade entre o convencimento do promotor e do magistrado, melhor explicando: entendendo o Ministério Público pela não existência de crime, não cabe ao magistrado exercer qualquer juízo de valor sobre a existência ou não do crime, uma vez que a partir desse momento o magistrado estaria atuando de ofício, ou seja, sem acusação e em flagrante desrespeito ao sistema acusatório” (Boletim do IBCCrim, nº 152 – julho 2005, p. 19).
A discussão não é nova. Interessante, neste aspecto, o posicionamento de Ary Azevedo Franco, ao comentar o mencionado dispositivo legal: “Também sempre entendemos que, uma vez que o Ministério Público houvesse opinado pela absolvição do réu, nada mais cabia ao juiz senão acolher o petitório do Ministério Público, porque sempre consideramos o mesmo como autor da ação, e dês que era ele o primeiro a reconhecer que dela havia decaído, não devia o juiz entrar na apreciação da prova para discordar do Ministério Público” (Código de processo penal, vol. 1, Rio de Janeiro: Editora A noite, 1950, p. 386). Mas esse próprio autor, frente aos termos peremptórios do preceito em estudo, passou a reconhecer tal possibilidade conferida ao julgador e que, efetivamente, parece mais adequada.
A um, pois a sentença deve representar a íntima convicção do Juiz sobre o mérito da causa, não se subordinando a nenhum pedido anterior. E, a dois, por vigorar, em nosso processo penal, o principio da indisponibilidade, por meio do qual prevalece o interesse público na persecução penal nos crimes de ação penal pública. Fosse diferente, aliás, o julgador da causa não seria o juiz, mas sim o Ministério Público, a cujo pedido de absolvição estaria sempre vinculado aquele primeiro.  Tal faculdade concedida ao Juiz, porém, reforça, de outro lado, o entendimento segundo o qual pode o parquet recorrer em favor do réu do qual a absolvição foi pedida.
Invocar-se o sistema acusatório como fator impeditivo para que o juiz condene frente a um pedido de absolvição parece absolutamente equivocado. Afinal, se há evidente separação entre acusador, defensor e julgador, cada um ocupando um compartimento estanque na relação processual, aí sim há de se admitir a condenação mesmo com anterior pedido de absolvição. Com efeito, a vinculação do juiz ao pedido do Ministério Público, da forma que sugerida, é que romperia com o sistema, na medida em que transferiria para a acusação pública o poder de julgar, reunindo, em um só órgão, as funções de acusar e decidir, em clara reminiscência ao sistema inquisitivo.
Outro equívoco reside em se afirmar que, se o Ministério Público pode requerer o arquivamento do inquérito policial, também pode retirar a acusação, pedindo a absolvição do réu. Ocorre que o pedido de arquivamento, pelo menos, é objeto de crivo judicial, podendo o juiz, dele discordando, invocar o art. 28 do Código de Processo Penal. Já frente a um pedido de absolvição, se acolhida a tese, não restaria outra alternativa ao juiz senão a de acolhê-lo. Com isso, se afastaria, por completo, a possibilidade de controle dos atos judiciais pelas instâncias superiores, e – diria – dos atos do Ministério Público, eis que, na prática, ninguém recorreria de tal decisum, ante a evidente falta de interesse (rectius: utilidade).
Esse importante fundamento político, que justifica o duplo grau de jurisdição, a saber a possibilidade da salutar revisão das decisões judiciais, ficaria restrito ao improvável recurso do ofendido, das pessoas relacionadas no art. 31 do CPP ou do assistente da acusação. Ou, ainda, às raras hipóteses nas quais se admite o recurso obrigatório. Na prática, a sentença absolutória repousaria, para sempre, no silêncio de um arquivo, inatingível à instância superior. Aliás, a se privilegiar tal entendimento, se deveria concluir, por coerência, que também o art. 28 do CPP não foi recepcionado pela Constituição. Claro: se o juiz não pode discordar do pedido de absolvição, tampouco poderá apresentar qualquer oposição quando requerido o arquivamento do inquérito policial pela acusação pública.
Também não nos parece correta a argumentação de que, ao condenar, conquanto tenha o Ministério Público pedido a absolvição, estaria o juiz agindo de ofício. Esse entendimento parece altamente contaminado por regras típicas do processo civil, cristalizadas através do velho aforismo ne procedat judex ex officio, onde o interesse em jogo, via de regra, é disponível, podendo a parte dele transigir. Mas, se mesmo no processo civil tal brocardo já perdeu força (cf. art. 130 do Código de Processo Civil), no processo penal ele jamais incidiu com total plenitude. Aqui, ao contrário do processo civil, o juiz não é um mero espectador inerte ou “convidado de pedra”. Ao revés, está comprometido com a busca da verdade real, tanto quanto o Ministério Público, não se satisfazendo, assim, com a mera verdade formal, que basta ao juiz cível.
Alguém dirá que, nas ações penais privadas, não é dado ao juiz condenar sem um pedido expresso do querelante nesse sentido. E, de fato, é assim. Com efeito, nos termos do art. 60, inc. III, do Código de Processo Penal, a ausência de um pedido de condenação, em sede de alegações finais, induz à perempção da queixa-crime, a ser obrigatoriamente reconhecida pelo juiz, impedido que se encontra de condenar o querelado frente a tal circunstância.  Ocorre que a ação penal privada repousa em fundamentos totalmente diversos da ação penal pública. Enquanto que nesta última prevalece o interesse público, naquela primeira conta apenas a manifestação de vontade do ofendido que, segundo critérios de conveniência e oportunidade, pode deflagrar – ou não -  o respectivo processo-crime. Nas ações penais privadas o Estado coloca à disposição da vítima o armamento para que, se assim o desejar, ela possa utilizá-lo. Esse armamento consiste no Código Penal e na legislação extravagante que contempla a ocorrência de um crime. Se a vítima vai empregá-lo é algo que fica restrito ao âmbito de sua discricionariedade, sem que se cogite de qualquer influência externa. Por isso mesmo que, nessa espécie de ação, há a possibilidade de renúncia e perdão, institutos desconhecidos na ação penal pública.
Daí se concluir como perfeitamente cabível a condenação do réu mesmo frente a um pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público, única conclusão, aliás, que se coaduna com a literalidade do texto legal. Resta ao parquet, não se conformando com a condenação, recorrer em favor do réu, em postura, hoje, tranquilamente admitida pela doutrina e jurisprudência.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)

PINTO, Ronaldo Batista. Pode o juiz condenar mesmo com pedido de absolvição pelo Ministério Público?Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 21n. 462125 fev. 2016. Disponível em: . Acesso em: 28 fev. 2016.

politicacidadaniaedignidade.blogspot.com